O primeiro de maio adentrou em brandas nuvens em Teresina, não se vê
festas, manifestações ou reivindicações por parte dos trabalhadores
organizados, seguindo-se assim uma tradição na cidade. Contudo, em momentos
distantes, quando a capital era um pequeno e provincial centro urbano, existiram
concorridos eventos promovidos para os trabalhadores, como é exemplo o primeiro
de maio de 1906.
Até onde uma pesquisa inicial sugere, a data começou a ser comemorada em
Teresina em meados da primeira década do século XX. Em 1906, Jônatas Batista
por meio do jornal O Operário mostrou-se
entusiasmado pelas festividades que estavam sendo preparadas, prometendo
repetir os bem sucedidos folguedos de 1905.
Neste período buscava-se ainda uma construção dos sentidos para tais
comemorações na cidade. Os primeiros significados em torno do primeiro de maio
surgiram no final da década de 1880 na Europa, após o fortalecimento dos
movimentos operários do continente, sendo um símbolo da luta pela redução da
jornada de trabalho para oito horas. Em julho de 1889, em lembrança ao
centenário da Revolução Francesa, reuniram-se em Paris operários e intelectuais
ligados ao marxismo de vários países, contando com representantes franceses,
alemães, ingleses, belgas, russos, entre outros. Esse congresso aprovou a
realização de uma manifestação internacional em primeiro de maio de 1890, com o
intuito de pressionarem a burguesia simultaneamente.[2]
As manifestações no
primeiro de maio de 1890 ocorreram em vários países. Na Alemanha, com o intuito
de não incitarem a oposição do governo, o movimento operário decidiu por
realizar festas, atitude imitada em outros países, iniciando-se assim o caráter
festivo do primeiro de maio. No Brasil, Santos foi a primeira cidade a festejar
a data, em 1895.[3]
Em Teresina, as
festividades de 1906 foram detalhadamente planejadas e organizadas pela
sociedade Aliança Federativa dos Obreiros do Piauí. As primeiras notícias
surgiram com dois meses de antecedência, isso por meio do jornal O Operário, que era redigido por Jônatas
Batista e M. Saraiva de Lemos. O periódico criou um concurso para a escolha da
poesia que serviria de letra para o hino do trabalho, música composta pelo maestro
Pedro de Alcântara. Do concurso, saiu-se vencedor Totó Rodrigues.[4]
Nota-se por meio deste periódico a construção de uma idealização do Dia
do Trabalhador, fruto da ideologia que revestia o trabalho como uma forma de
dignificar o homem, enobrecendo-o, tornando-o concorrente ao crescimento da
nação, ideologia que ganhou força após o fim do período escravocrata, quando o
labor era considerado algo desonroso. As comemorações da data eram divulgadas como sinais de patriotismo,
civilidade e virtude dos homens que lutavam pela vida, cuja essência seria
conhecida somente pelas sociedades cristãs, que não mais o viam como um
martírio após o castigo divino:
E o trabalho
que é uma virtude, desvirtuado no meio dos povos pagãos e das nações onde a luz
do evangelho ainda não penetrou, vai-se nobilitando graças à influência
benéfica do cristianismo.
O mundo pagão
desvirtuou o trabalho e o mundo cristão o santificou.[5]
Nota-se ainda a
participação de intelectuais assíduos na imprensa teresinense, na organização e
legitimação dessas comemorações, como é o caso de Jônatas Batista, M. Saraiva
de Lemos, Benedito Lemos, João da Cruz Monteiro, Zito Batista e o consagrado
Higino Cunha, republicano histórico e mestre da mocidade letrada da cidade.
O número do O Operário de primeiro de maio foi todo em
glorificação ao trabalho e divulgação das festividades. O periódico Borboleta, do mesmo dia, estampou na
primeira página a letra do Hino do Trabalho e dedicou seu editorial a
parabenizar os organizadores das festividades:
Na vida amargurada
desses paladinos da arte, também há um dia de alegria imensa e de imensas
venturas. [...]
Hoje, que passa
esse festejado dia fazendo brotar, nos corações dos artistas, a flor de uma
alegria santa, é justo que todos se manifestem jubilosos e entusiasmados
perante esta nobre causa.[6]
No primeiro de maio
de 1906 as festividades começaram ainda pela madrugada com salva de tiros. Na
data solene, houve apresentação de espetáculo no Teatro 4 de Setembro,
solenidades que contaram com a participação de lideranças políticas, religiosas
e civis, além de conferências, cuja principal foi de cunho socialista e
elaborada por Higino Cunha.[7]
As festividades contaram com ampla concorrência da sociedade teresinense.
Zito Batista, em seu discurso no Teatro 4 de Setembro, louvou a atitude dos
organizadores e exaltou a elevada manifestação de civilidade dos trabalhadores
que se organizavam em algumas sociedades.
Dias longínquos os de 1906, poucas vezes vistos na jovem Teresina, cuja
dinâmica da vivência capitalista faz com que o dia se passe como um simples
feriado, sem festas ou reivindicações. Por fim, correndo o risco de cair na pieguice,
faço das palavras de Zito, as minhas: “eu vos saúdo, eu vos saúdo trabalhadores
altivos! Eu vos saúdo”.[8]
[1] Graduando em História
pela Universidade Federal do Piauí e bolsista do núcleo de Pesquisa em Memória
– NUPEM/UFPI.
[4] Sobre o concurso,
conferir: CONCURSO. O Operário, Teresina, ano
1, n. 3, 18 mar. 1906, p. 1; RODRIGUES, Totó. Hino do Trabalho. O Operário, Teresina, ano
1, n. 6, 8 abr. 1906, p. 1. HINO
do trabalho. O Operário, Teresina,
ano 1, n. 6, 8 abr. 1906, p. 3.
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