terça-feira, 12 de maio de 2015

13 DE MAIO: ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO?

Rodrigo Caetano Silva[1]

A escravidão negra nas terras brasileiras se constituiu em um processo de longa duração. Ela foi fundamental na expansão da economia e na formação socioeconômica e cultural de nossa nacionalidade. A escravidão de negros foi bem mais que uma trivial relação de trabalho, neste caso de expropriação total do trabalho por uma das partes dessa relação. No Brasil, a escravização de homens de pele escura foi bastante presente, sendo a principal forma de trabalho por mais de trezentos anos, sem que houvesse vozes contrárias fortes o suficiente para pregar contra ela. Somente a partir da segunda metade do século XIX é que começou um movimento para pôr fim à escravidão, sendo um de seus principais lideres o intelectual Joaquim Nabuco. 
O movimento abolicionista do qual Nabuco fez parte pode ser divido em três fases. A primeira começou em 1850, com a decretação da Lei Eusébio de Queirós, que determinava o fim do tráfico negreiro para o Brasil através Oceano Atlântico – praticamente uma ratificação da decisão britânica de 1831 de pôr fim ao tráfico. Se a armada britânica combatia o tráfico na costa africana, do lado brasileiro do oceano a lei não gerou efeitos imediatos. O tráfico ilegal desenvolveu-se intensamente no período posterior à lei, tendo seu fim, segundo Duque Estrada, em 1853, três anos após a lei ser posta em vigor, quando “Joaquim Nabuco decide então reprimir por todos os meios qualquer nova tentativa de pirataria negreira”(ESTRADA, 2012, 34). 
A segunda fase inicia-se a partir da década de 70 do século XIX, com a ainda incipiente transição da mão-de-obra escrava para a mão-de-obra livre, e com a decretação, em 1871 da Lei Rio Branco, também conhecida como Lei do Ventre Livre. Esta lei considerava livres todos os filhos de mulheres escravas nascidos a partir de se sua promulgação. Porém, tal lei não foi seguida à risca.
Ela estabelecia duas possibilidades para os filhos dos escravizados que nascessem posteriormente a ela: as crianças poderiam ficar aos cuidados dos seus senhores até que elas completassem vinte e um anos, ou possibilitava que elas fossem entregues ao Estado, mediante indenização. O primeiro caso foi o mais comum e beneficiaria os senhores que poderiam usar a mão-de-obra destes “livres” até os vinte e um anos de idade. Com isso não nos resta dúvida de que tal lei era na verdade uma falsa liberdade do nascido cativo.

A terceira fase desponta na década de 80 do século XIX, período em que o movimento abolicionista ganha mais força, principalmente nas zonas urbanas. Neste período, houve grandes e calorosas movimentações em favor da emancipação dos escravos (COSTA, 2010. p. 79). Em 28 de setembro de 1885, foi promulgada a Lei Saraiva-Cotegipe, conhecida popularmente como Lei dos Sexagenários. Segundo esta lei, eram considerados livres todos os cativos que contassem idade de 60 anos ou mais. Esta lei beneficiaria poucos escravos, pois era raro eles conseguissem alcançar a idade de 60 anos, devido ao fato de que, submetidos a condições desumanas e extenuantes de trabalho, a maioria dos negros africanos escravizados morriam antes de chegar à idade estabelecida pela lei para que fossem tornados livres. Na verdade, esta lei foi uma tentativa de prologar a escravidão de negros e seus descendentes no Brasil. A Lei dos Sexagenários foi estabelecida com a intenção de ser um remédio neutralizador do movimento escravista, o que não deu certo. 
Estas três leis decretadas por políticos conservadores tinham por objetivo funcionar como solução homeopática para acabar com o sistema escravista – o que na verdade pretendia retardar seu fim. Ressaltem-se que as leis: Eusébio de Queirós (1850); do Ventre Livre (1871) e dos Sexagenários (1885) não foram seguidas à risca. Mesmo tendo elas um papel homeopático no combate ao regime de exploração de mão-de-obra cativa, foram importantes para a abolição da escravidão. 
O que muitos esquecem é que os escravizados não estavam bestializados aos acontecimentos que se seguiam ao longo da segunda metade do século XIX. Ao mesmo tempo em que o movimento abolicionista ascendia pelo Brasil, ocorria “eclosão de revoltas de escravos, fugas e outros tipos de rebeldia provocando reações cada vez mais violentas de senhores de escravos, so­bretudo daqueles congregados em Clubes de Lavoura” (MACHADO, 2011. p. 24). Acrescente-se a estes fatores o florescimento da propaganda abolicionista que contaminava as mentes do povo. 
Desta forma, tornava-se inevitável, na década de 80 do século XIX, a abolição da escravidão. Em 1880 foi fundada a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão, por iniciativa de Joaquim Nabuco. Neste ritmo, as manifestações calorosas em favor da emancipação só aumentavam. Províncias do Norte do Brasil, a exemplo do Ceará, decretavam oficialmente o fim do sistema escravistas. Em 13 de maio de 1888, foi decretado oficialmente o fim da escravidão, com a Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Bragança e Bourbon. 
O que não podemos deixar fugir de nossas mentes é o fato de que, mesmo a escravidão de seres humanos tendo fim legal no Brasil em 1888, muitos males que aconteciam antes da decretação da lei ainda permanecem extremamente vivos em nossa sociedade. Problemas como preconceito racial e social ainda são corriqueiros na sociedade contemporânea, ainda permeada por uma cultura escravocrata. Isso sem falar nas variedades de trabalhos análogos a escravidão que ainda insistem e persistem no Brasil do século XXI. 



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CORAND, Robert. Os últimos anos da escravatura no Brasil: 1850-1888. Ed. 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.

COSTA, Emília Viotti da. A abolição. Ed. 9. São Paulo: UNESP, 2010.

DUQUE ESTRADA, Osório. A abolição. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2012.

MACHADO, Maria H. P. T. Os abolicionistas brasileiros e a Guerra de Secessão. In: Martha Abreu e Matheus Serva Pereira (orgs.). Caminhos da liberdade: histórias da abolição e do pós-abolição no Brasil. Niterói: PPGHistória- UFF, 2011.

NABUCO, Joaquim. O abolicionismo. Brasília: Senado federal, Conselho Editorial, 2010. 


[1] Atualmente é bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica - PIBIC e membro do Núcleo de Pesquisa, Documentação e Memória- NUPEM e do Núcleo de Estudo e Pesquisa em História do Piauí Oitocentista, ambos da Universidade Federal do Piauí. Foi bolsista do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência- PIBID e professor de História do Piauí do Instituto de Saber e Ensino- ISE. Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Piauí e Escravidão Negra no Piauí (1850-1888). Pesquisa escravidão urbana no século XIX, controle e resistência. Atualmente está pesquisando sobre a atividade política e de abolicionista de Antônio Coelho Rodrigues, através dos seus trabalhos dedicados a questão do elemento servil.

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